terça-feira, 1 de abril de 2008

Do ônibus o officeboy discou um numero no celular, alguns instantes depois informava à um amigo sobre a morte de um outro amigo vitimado na noite anterior com oito tiros no rosto. A comoção tomou conta do coletivo, todos passageiros participando daquele momento. Ele dizia ao colega que o enterro seria as 10:00 e que o caixão estaria lacrado por motivos óbvios.
Por um curto período fiquei pensando no caso... mais um jovem morto na periferia, oito tiros na cara... pura barbárie. Drogas, mulher ou acaso .... hora errada, lugar errado.
Lembrei do enterro da avó de uma amiga, no cemitério da Vila Alpina. No velório aquele climão pesado, em lugar pesado e super povoado de mortos e vivos. Pêsames, choros baixos e altos. Me distanciei dos amigos e familiares e pude notar do outro lado da alameda de velórios um caixão solitário, lacrado e solitário. Ao lado do esquife estava uma adolescente com um bebê no colo, um rapaz de boné e um bêbado que perambulava pelo espaço. Passaram-se algumas horas e uma pequena multidão prestava a sua última reverencia ao cadáver da citada senhora de 75 anos, que agora em companhia de amigos, filhos e netos... esperava o sepultamento. Enquanto isso continuava a olhar para dentro da sala vazia em frente. Vazia de pessoas, choros e histórias. Quem era aquela pessoa sem amigos, filhos e netos.
Cinco minutos depois aquele caixão pobre e lacrado deixa a sala. Funcionários do cemitério ajudam o único acompanhante homem a carregar aquele caixão desprovido de dignidade para a ala do cemitério de covas rasas, cruzes rosas e números. Acompanho com o olhar o cortejo ridículo que some nos morros dessa cidade de mortos.
O pastor orou e os filhos fecharam o caixão. O cortejo imenso seguiu, as pessoas em voz baixa comentavam do legado da falecida, da bondade e das virtudes.
As coroas de flores sobre o jazigo agora repousam; aquele cheiro de flor e vela me da náuseas. Todos seguem abraçados para suas vidas. Eu não resisto e vou ver onde repousa agora o meu ilustre desconhecido. Obviamente não o encontro. Mas percebo que nessa parte da cidade residem meninos de até 20 anos, pobres, sem biografia, sem pastor, sem padre, sem nada. Quantos cachorros andam por aqui... Esgotado vou embora... prefiro a cidade dos vivos.

No ônibus continuo a escutar mais uma cronica policial. De repente uma gargalhada atravessa o corredor.
- zoando!!!! Hoje é dia da mentira.... hahahahahaah
Fala o officeboy para o amigo. Alívio geral.
Era primeiro de Abril e a mentira pairava por entre árvores e pessoas.

2 comentários:

Unknown disse...

DEMAIS...

por segundos vc me fez esquecer desta data, me transportou para o enterro da minha vó..como gostaria que aquele dia fosse MENTIRA...por toda adoração daquela alma, fria que descansava ao som de uma prece final...A morte se faz livre quando enriquecemos nossa mente com a bondade de DEUS e é assim que eu vejo os dias, apesar de relembrar e de sentir a imensa saudade que não nos controla... cada lembrança me da a certeza de um breve descansar na pureza das nuvens e um certo reencontro, garantido por Deus e pelos anjos...

Vc tocou meu coração, amo sua amizade e seus magníficos textos,

bj sua amiga irmã Lu

Vitor Novais disse...

Que texto legal, bicho. D+. Me fez lembrar um episódio que eu passei por um amigo, na verdade a mãe dele tinha falecido e eu, depois de anos de pavor de cemitério e pessoas mortas, passei a noite velando o corpo da mãe dele, e não sei onde arranjei tanta coragem, até hj eu não sei. Depois disso, acho que encarei a coisa com mais naturalidade, acho.

abraços Suzuki, curti os textos.